Branca de Neve e os Sete Anões (1937)

Branca de Neve e os Sete Anões (1937)

por Giovani Zanirati.


Branca de Neve e os Sete Anões (1937)
Direção: William Cottrell, David Hand, Wilfred Jackson, Larry Morey, Perce Pearce, Ben Sharpsteen
Roteiro: Ted Sears, Richard Creedon, Otto Englander, Dick Rickard, Earl Hurd, Merrill De Maris, Dorothy Ann, Webb Smith
País: Estados Unidos
Nota: 10/10

Aproveitando a exaustiva polêmica envolvendo o live-action de Branca de Neve e os Sete Anões, resolvi revisitar a animação clássica da Disney que, desde sua estreia em 1937, tem encantado gerações ao longo de quase um século. Assim como tantas outras produções do estúdio, Branca de Neve é baseada em um conto dos Irmãos Grimm — com o toque inconfundível de fantasia e suavização das nuances sombrias presentes no original.

Mais do que uma simples adaptação, trata-se da primeira animação em longa-metragem produzida pela Walt Disney Studios, com envolvimento direto do próprio Walt Disney, que enfrentou grande ceticismo da indústria na época. Muitos apelidaram o projeto de “a loucura de Disney”, duvidando que o público suportaria assistir a um desenho animado de longa duração, com alto custo de investimento. No entanto, o resultado foi um verdadeiro marco na história do cinema — tanto artisticamente quanto comercialmente.

O longa-metragem revolucionou o gênero com técnicas inovadoras de animação, como o uso do rotoscópio — em que atores reais eram filmados e seus movimentos serviam de base para a animação quadro a quadro. Isso conferiu um dinamismo raro para a época, além de um refinamento visual que permanece encantador até hoje. A ambientação da floresta, os detalhes no castelo e a expressividade dos personagens são frutos de um cuidado artístico notável, que pavimentou o caminho para tudo o que viria depois na animação ocidental.

A narrativa de Branca de Neve é, inegavelmente, simples. No entanto, sua simplicidade está longe de ser uma fragilidade. Pelo contrário: é justamente esse enredo direto, aliado a uma execução primorosa, que torna o filme acessível, tocante e atemporal. A história, centrada na doçura da protagonista, em animais encantadores e na clássica luta entre o bem e o mal, ainda tem muito a oferecer às novas gerações.

A introdução da vilã — a vaidosa Rainha que consulta o Espelho Mágico em busca de validação — dá o tom sombrio da obra. A descoberta de que existe alguém mais bela que ela, Branca de Neve, desperta uma inveja corrosiva que culmina em um plano cruel: ordenar ao caçador que a mate e leve seu coração como prova. Para uma obra voltada ao público infantil, essa premissa pode parecer pesada — mas a forma como é conduzida suaviza os elementos mais sombrios, equilibrando tensão e leveza de maneira eficaz.

Ao ser poupada pelo caçador, Branca de Neve foge pela floresta — em uma das sequências mais visualmente impactantes — e acaba encontrando refúgio na casa dos sete anões. A partir desse ponto, o filme assume um tom mais lúdico e cativante. A interação entre a protagonista e os anões, cada um com uma personalidade distinta e memorável, adiciona humor e carisma à narrativa. Personagens como Zangado, Dunga e Mestre tornaram-se ícones da cultura pop.

A Rainha, ao descobrir que Branca de Neve ainda está viva, transforma-se em uma bruxa sinistra — outra figura emblemática que viria a influenciar inúmeras vilãs do cinema de animação. Apesar do desenvolvimento relativamente superficial da antagonista, sua presença é forte o suficiente para deixar uma impressão duradoura. Talvez uma construção mais profunda de sua motivação seja um desejo moderno, incompatível com a estrutura narrativa da década de 1930.

O final, com a chegada do príncipe encantado e o “beijo de amor verdadeiro”, pode soar apressado e um tanto aleatório aos olhos contemporâneos. No entanto, é preciso contextualizá-lo dentro dos valores e expectativas da época. Ainda assim, é válido refletir sobre como a resolução da história poderia hoje privilegiar o poder da amizade, principalmente entre os anões e a jovem heroína — o que, de certo modo, tornaria a narrativa ainda mais rica e emocionalmente poderosa.

Branca de Neve e os Sete Anões é mais do que uma animação histórica: é uma aula de narrativa visual, direção artística e inovação técnica. Mesmo após quase 90 anos, continua sendo um dos filmes mais influentes da Disney — não apenas por seu pioneirismo, mas também por seu coração. Revisitar essa obra é, ao mesmo tempo, um exercício de nostalgia e uma redescoberta de como o cinema pode ser simples, encantador e profundamente humano.

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