Entrevista com o Demônio (2023)

Entrevista com o Demônio (2023)


por Giovani Zanirati



Entrevista Com o Demônio (2023)
Direção: Cameron Cairnes, Colin Cairnes
Roteiro: Cameron Cairnes, Colin Cairnes
País: Austrália, EUA, Emirados Árabes Unidos
Nota: 8,5/10

Entrevista com o Demônio, lançado em 2023, marca um ponto significativo por sua habilidade em manter o elespectador cativado com uma trama pouco convencional e bem produzida. Embora o filme inclua elementos humorísticos e não tenha grandes sustos visuais, apesar do olhar penetrante e perturbador de Lilly (Ingrid Torelli), ele constrói um terror mais cadenciado, psicológico, metalinguístico, que se intensifica, especialmente através das interações entre o apresentador do programa e a menina supostamente possuída por um demônio.

Além disso, o filme oferece uma crítica contundente ao sensacionalismo extremo da mídia, que, de maneira audaciosa e inescrupulosa, recorre a todos os artifícios para obter audiência e poder. Esse aspecto não precisa de um cenário específico ou de referências só aos Estados Unidos; o Brasil, por exemplo, também é um reflexo do modelo estadunidense de ver a televisão como um mercado para alcançar as grandes massas. Nos anos 80 e 90, os programas de auditório no Brasil se expandiram, explorando o bizarro, com quadros controversos, a entrevistas a falsos grupos criminosos e até mesmo ao sobrenatural.

Na trama do presente filme, o apresentador de programa de auditório, o ambicioso e misterioso Jack Delroy (David Dastmalchian), em busca desesperada de audiência, prepara uma edição especial de Halloween para entrevistar Lilly, uma jovem supostamente possuída, que sobreviveu ao massacre de um culto satânico. No entanto, a escolha revela-se cada vez mais bizarra à medida que forças ocultas desvendam o passado de Jack e colocam a vida de todos em perigo.

No início, o filme explora, por meio de recortes inteligentes, o crescimento e declínio de Delroy na década de 1970, contextualizando sua luta pela liderança, apesar do sucesso recorrente. Aparentemente, apenas o primeiro lugar é válido. Esse corte apresenta, também, o maior sofrimento, a morte da esposa para o câncer. Adicionalmente, levanta dúvidas sobre a possível participação do apresentador em uma seita secreta. Esses elementos são essenciais para o desenvolvimento do terror, que começa a ser proposto.

Delroy, disposto a fazer qualquer coisa para aumentar sua audiência, inclusive expor anteriormente sua esposa doente na televisão, realiza um programa especial de Halloween com a presença de diversos convidados, como um médium charlatão, um cético fanfarrão em relação ao sobrenatural, que oferece dinheiro para qualquer um que provar o contrário e a menina Lilly e sua médica, June (Laura Gordon).

O elenco está muito bem. David Dastmalchian se destaca como o apresentador caricato, como qualquer outro que fez sucesso na televisão, mas que também revela camadas, mudanças de humor principalmente com as câmeras desligadas e, por fim, com seu passado e segredos sendo expostos. Lilly também se destaca como uma jovem excêntrica, por olhares penetrantes diretos à câmera e sorrisos macabros, onde se mescla o vazio de sentimentos e algo perverso. Em alguns, momentos remete ao clássico "O Exorcista".

Um dos maiores méritos do filme é sua excelente produção, que recria brilhantemente o ambiente de 1977, com uma caracterização realista do programa, incluindo o apresentador, a banda, o assistente de palco e o público. Vale o destaque para o figurino, o cabelo, os móveis do estúdio. A sensação é de que estamos diante de um verdadeiro programa setentista estadunidense. As tomadas de câmera ao vivo são bem feitas, embora algumas cenas dos bastidores possam parecer um pouco desajeitadas, perdendo a proposta do filme.

Em termos de desenvolvimento, a simplicidade é uma característica marcante do filme. Apesar de ser uma obra sobre possessão, consegue manter-se objetiva e realista, mesmo em momentos de expectativa mais bizarra. Contudo, a exceção está na reta final, onde o filme muda de rumo, abraçando definitivamente o bizarro, as alucinações e efeitos especiais que, a meu ver, não são eficazes. O final apressado parece destoar da qualidade geral da obra, mas deixa pontas ambíguas para interpretações.

Por fim, apesar de alguns elementos negativos, trata-se de um dos bons filmes de terror lançados nos últimos anos, capaz de divertir e também assustar, dependendo de como o espectador compra esse projeto. Conforme mencionado o início é muito importante para entender o contexto, quando ao invés de abandonar, simplesmente intensifica de forma sádica sua crítica ao poder, ao sensacionalismo e a mídia e o significado de sacrifício.

Postar um comentário

0 Comentários