Fragmentado (2016)

Fragmentado (2016)


por Giovani Zanirati




Fragmentado (2016)
Direção: M. Night Shyamalan
Roteiro: M. Night Shyamalan
País: Estados Unidos
Nota: 09/10

Desde o estrondoso sucesso de O Sexto Sentido (1999), o cineasta M. Night Shyamalan consolidou-se como uma figura de referência significativa entre críticos e cinéfilos. Todos os seus trabalhos subsequentes, incluindo o recente Armadilha (2024), têm atraído atenção, seja positiva ou negativa. Ou seja, ele não passa despercebido. Em 2000, o diretor lançou uma obra notável que explora seu interesse por quadrinhos no cinema: Corpo Fechado (2000).

Neste filme, David Dunne (Bruce Willis) e Elijah Price (Samuel L. Jackson) protagonizam um confronto distinto do convencional universo dos super-heróis, adotando uma abordagem mais realista e imbuída de suspense. Inicialmente, Corpo Fechado não recebeu a recepção esperada, com o diretor alegando que a verdadeira proposta do filme não foi adequadamente divulgada pelo marketing.

No entanto, com o passar dos anos, o filme conquistou o reconhecimento como uma das obras-primas do cineasta indiano naturalizado estadunidense. Após dezesseis anos de trabalhos questionáveis, Shyamalan surpreendeu o mundo do cinema com Fragmentado (2016), uma sequência quase independente de Corpo Fechado. Contudo, a conexão entre os filmes se revela apenas no desfecho, com uma reviravolta crucial que encantou o público na época de seu lançamento.

Na trama de Fragmentado, três jovens — Casey Cooke (Anya Taylor-Joy), Marcia (Jessica Sula) e Claire (Haley Lu Richardson) — são sequestradas por um homem enigmático interpretado por James McAvoy. O que poderia ser uma narrativa comum de sobrevivência revela-se, na verdade, uma trama surpreendente do início ao fim. Embora o filme explore a "batalha pela vida", seu foco principal é o sequestrador, o misterioso Kevin.

Casey, uma das sequestradas, ganha destaque através de flashbacks significativos de seu passado, que se entrelaçam de maneira coesa com suas ações no presente. Por exemplo, quando Marcia é atacada e levada para outra sala do cativeiro, as vítimas presumem que ela será abusada. Casey sugere que Marcia faça xixi nas calças para evitar o abuso. O filme, de forma sutil, contextualiza o desenvolvimento de Casey sem forçar a exposição de suas lembranças e traumas passados.

No entanto, o verdadeiro destaque da narrativa é o sequestrador, cuja excentricidade é notável. Seu comportamento altera-se progressivamente, ora assemelhando-se a uma criança, ora a uma mulher experiente. Casey percebe que o sequestrador é muito mais incomum do que inicialmente parecia. Portador de transtorno dissociativo de identidade, o vilão possui vinte e três personalidades, embora apenas quatro são realmente apresentadas, com o restante permanecendo na sombra. As personalidades dominantes planejam oferecer as meninas como uma oferenda para o surgimento de uma nova personalidade, conhecida como A Besta.

A trama se distingue por sua abordagem inovadora e intensa, mesclando luta pela sobrevivência e descoberta. As meninas enfrentam diversos testes durante as visitas das personalidades dominantes ao cativeiro. Simultaneamente, o sequestrador (ou sequestradores) participa de um processo terapêutico com a Dra. Karen Fletcher (Betty Buckley), que demonstra um profundo conhecimento e apreço pelo paciente, mas também manifesta preocupações sobre suas ações.

O clima de tensão e suspense é habilmente conduzido, principalmente através da relação entre as personalidades e o misterioso surgimento da Besta, cuja natureza e objetivos são revelados progressivamente.

O mistério é habilmente construído através de uma câmera estática e da escolha dos ângulos, que ocultam detalhes até que sejam desvelados pelos diálogos, culminando em um desfecho sinistro e impactante, ao estilo slasher, em corredores escuros e claustrofóbicos.

O grande mérito de Fragmentado, contudo, reside na performance de James McAvoy, que entrega um dos trabalhos mais memoráveis da sua carreira. Com a desafiadora tarefa de interpretar um personagem com múltiplas personalidades, ele evita clichês e diferenças superficiais, oferecendo uma interpretação sutil e convincente. McAvoy se destaca pela sofisticação nas mudanças de trejeitos e na distinção entre as personalidades, como Patricia (uma figura autoritária), Dennis (uma figura excêntrica e assustadora), Hedwig (uma criança de nove anos) e Barry (um conhecedor de moda e principal paciente da Dra. Fletcher).

Em suma, Fragmentado é uma excelente realização de Shyamalan, destacando-se pelo suspense inovador, um clímax excepcional e a contextualização aprofundada dos personagens centrais. A revelação da conexão com Corpo Fechado adiciona uma camada de sofisticação à trama, tecendo uma rede de referências ao imaginário dos quadrinhos do projeto inicial, e desenvolvendo um vilão tão impactante e notável quanto os icônicos adversários das grandes editoras de quadrinhos.

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