Monster

Monster


por Giovani Zanirati





Monster (2004-5)
Autor original: Naoki Urasawa
Direção: Masayuki Kojima
Roteiro:Tatsuhiko Urahata
País: Japão
Nota: 09/10


Os animes têm alcançado imenso sucesso no Brasil, especialmente após a popularização de obras como Os Cavaleiros do Zodíaco, Dragon Ball, Pokémon e Naruto. Com o tempo, as produções animadas japonesas passaram a adquirir de maneira equivocada características estereotipadas para o público mais amplo, moldando uma narrativa comum, embora com algumas variações nas tramas. Não sinto vergonha em admitir que faço parte desse público, pois, apesar de meu conhecimento sobre alguns animes, ainda há uma lacuna significativa em minha compreensão dos diferentes estilos.

Recentemente, tive a oportunidade de assistir a uma obra notável que se distingue dos animes mais conhecidos: Monster. Baseado no mangá de Naoki Urasawa, um renomado mangaká, a trama apresenta um thriller psicológico de tirar o fôlego, especialmente pela sua complexidade e realismo. O mangá, publicado entre 1994 e 2001, ganhou a versão para anime em 2004, produzida pela Madhouse.

A trama se passa na Alemanha entre as décadas de 80-90, durante a Guerra Fria e acompanha o talentoso neurocirurgião japonês Kenzo Tenma, que enfrenta consequências graves após tomar uma decisão nobre, onde na sua visão todas as vidas humanas são consideradas igualmente valiosas, independentemente de status, bens ou posição social. Quando Tenma era encarregado de realizar uma cirurgia em um trabalhador local, foi instruído pela diretoria do hospital a trocar de paciente e operar um renomado cantor de ópera, cuja vida, devido ao seu status, era considerada mais importante.

Embora a cirurgia tenha sido bem-sucedida, Tenma é consumido por uma profunda sensação de culpa ao descobrir que o trabalhador, a quem ele inicialmente deveria ter operado, não sobreviveu. O sofrimento da esposa e do filho do trabalhador leva o doutor a uma reflexão contínua. A situação se agrava quando sua noiva, filha do diretor do hospital, revela que a política do hospital prioriza pacientes de status social elevado, para promover a fama da instituição. Segundo ela, as vidas não são iguais.

Em um caso semelhante, logo após o triste ocorrido, um menino chamado Johan Liebert, filho adotivo de um burocrata, é levado ao hospital após um tiro na cabeça. Apesar da gravidade da situação, Tenma é novamente orientado pela diretoria a atender outra pessoa, o prefeito. Impulsionado por um senso de justiça, ele desobedece e realiza a cirurgia em Johan, salvando sua vida, mas resultando na morte do político devido à incapacidade dos demais profissionais em realizar o procedimento.

A vida de Tenma muda drasticamente. Sua noiva rompe o noivado, ele é afastado da responsabilidade sobre o menino e sua irmã gêmea Nina, e começa a perder cargos e prestígio no hospital. Diante da hipocrisia da diretoria e dos colegas, que lucram midiaticamente com o caso de Johan, Tenma deseja uma severa punição a todos. Coincidentemente, uma série de assassinatos ocorre no local, incluindo o do diretor, o que, paradoxalmente, faz com que a carreira de Tenma prospere ao longo dos anos. No entanto, ele passa a ser perseguido por Lunge, um detetive obstinado, que o vê como o principal suspeito das mortes.

Mas será que ele é culpado? Desde o início, o anime apresenta o médico como um personagem bom e inocente. No entanto, a decisão de salvar o menino desencadeia uma enorme cadeia de eventos. Johan, o jovem salvo, torna-se responsável por uma série de mortes e por um clima de terror psicológico na Alemanha. Johan é uma espécie de mal encarnado. Dessa forma, Tenma tentar reverter esse cenário caótico.

Ao longo de 74 episódios, Monster explora uma trama madura e intensa sobre a natureza humana. O suspense e o drama são suas principais características, sem espaço para alivio cômico. Consegue apresentar uma gama rica e sofisticada de personagens que recebem seus espaços em tela, com suas personalidades e características bem definidas, mas completamente interligados com as figuras centrais, Tenma e Johan.

Embora exista uma clara oposição entre herói e vilão, ambos são desenvolvidos de forma complexa, revelando suas diferenças e semelhanças sem cair no maniqueísmo. Tenma passa por uma transformação profunda, refletida em sua aparência. Inicialmente, como um médico promissor, exibe simpatia, carisma e um sorriso que revela sua generosidade. No entanto, sua luta contra Johan o transforma em uma pessoa melancólica e taciturna, com um olhar vazio. Johan, por sua vez, é uma presença quase etérea, muitas vezes oculto mas sempre onipresente, aumentando a tensão psicológica ao redor de seu passado, presente e futuro. Sua frieza e manipulação brutal lembram, em alguns aspectos, o Conde Drácula de Bram Stoker, garantindo-lhe um status de grande vilão entre os fãs de anime.

O anime também aborda questões políticas e sociais, como o legado do nazismo e do fascismo, conectando-se com o passado de Johan, Nina e dezenas de crianças. Certos momentos são perturbadores, especialmente devido às experiências bizarras envolvendo jovens, prostituição e drogas, exigindo cautela ao assistir. A série não é difícil de entender, mas apresenta diversas pontas e personagens que se conectam para construir sua mensagem, exigindo atenção do telespectador.

A animação também é um primor. Mantendo-se coesa e orgânica ao longo dos episódios, ela consegue se diferenciar de boa parte dos animes com traços mais reais, definido cautelosamente o sentimento dos personagens. Conforme mencionado isso ocorre com as feições de Tenma ( abalado) e Johan (frieza), mas também reforça as expressões de desespero (Nina), depressão e sintomas de alcoolismo (Eva Heineman, a ex- noiva de Tenma), mistério (Wolfgang Grimmer).

Monster é um grande anime. Um clássico. Considero-o ideal para uma maratona para que telespectador possa acompanhar com mais facilidade e não perder suas nuances. Pessoalmente, como não tenho o hábito de assistir a maratonas, acabei perdendo alguns elementos importantes, o que pode ter diminuído um pouco o impacto desta notável obra.

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