O Sequestro do Voo 375 (2023)

por Giovani Zanirati

O Sequestro do Voo 375 (2023)

Direção: Marcus Baldini

Roteiro: Lusa Silvestre, Mikael de Albuquerque

País: Brasil

Nota: 08/10

A era da ditadura militar, um dos períodos mais tumultuados na história do Brasil, deixou cicatrizes profundas em várias esferas, especialmente na economia. Assim, a população brasileira clamou pelo fim do regime e pelo início do processo de redemocratização, visando pelo menos a possibilidade de escolha de seus representantes. Esse processo foi gradual e demorado. O primeiro presidente civil pós-ditadura, no entanto, foi selecionado pelo congresso nacional, predominantemente composto por representantes da classe burguesa.

O mineiro Tancredo Neves foi eleito presidente da República em 1985. Contudo, o político veio a falecer antes de assumir o mandato, resultando na ascensão de seu vice, José Sarney, ao posto mais importante do país. Como de praxe, Sarney prometeu uma nova era de oportunidades e empregos. Entretanto, a realidade foi o oposto. Com diversos planos fracassados, a hiperinflação tomou conta do Brasil, elevando os preços dos produtos e gerando uma queda no consumo, levando a economia à ruína. O desemprego aumentou, e a desigualdade e a miséria se tornaram predominantes.

A população, sentindo-se desamparada, tentou reagir por meio de protestos contra o governo. Esse era o cenário do maior país da América do Sul no início da redemocratização.

O filme "O Sequestro do Voo 375" retrata um episódio marcante desse caos social. Inspirado em eventos verídicos, o filme apresenta um trabalhador desiludido, Nonato, que protagoniza um ato de desespero ao sequestrar um avião da Vasp e ordenar ao piloto, comandante Murilo, que altere a rota em direção a Brasília, com a intenção de colidir com o Palácio do Planalto e assassinar o então presidente José Sarney.

O filme habilmente entrelaça uma narrativa que critica a sociedade, destacando a hiperinflação e o aumento do desemprego e da miséria, com um ambiente repleto de tensão, ação e drama. Desde o início, graças a um recorte inteligente, o tema fica evidente, permitindo que o filme seja dinâmico e orgânico, sem a necessidade de gastar tempo contextualizando o passado dos personagens. Outro aspecto interessante é o clima de tensão construído pela presença de Nonato no avião, que se intensifica com sua ação desesperada e o duelo particular com o piloto, uma outra vítima do brutal sistema que tanto prejudica a vida do trabalhador.

É importante ressaltar que o filme não romantiza o crime de Nonato, pois, embora movido pelo desespero, ele colocou dezenas de pessoas em uma situação caótica, ameaçando e matando inocentes, colocando a vida de todos em risco. Ao mesmo tempo, diante desse cenário, as autoridades políticas demonstram uma preocupação mais significativa em proteger a vida e a imagem do verdadeiro vilão da obra, o presidente Sarney.

A direção também é de qualidade, demonstrando coesão em sua execução, proporcionando composições visuais refinadas e conduzindo de forma magistral as intensas cenas de ação, além de extrair performances marcantes dos protagonistas. "O Sequestro do Voo 375" é um grande feito do cinema brasileiro.

Apesar de alguns problemas em seu desenvolvimento, principalmente em situações forçadas, como o diálogo de uma mulher com Nonato, o filme atende aos requisitos necessários para uma trama que reacendeu um caso até então pouco explorado pela arte brasileira.